3/01/2009

A Lira

Cansada dos ciúmes da sinhá
a lhe infernizar a vida,
a Negra Fulô pôs uma coroa de fitas,
espelhos e contas de aljofar
e foi ser Lira do Guerreiro das Alagoas.
Foi ser Lira a negra, num outro tempo,
e foi dançar no Natal,
na praça dos Martírios
para o Governador.

A todos arrebatou,
dançando no folguedo,
especialmente quando cantou:
"Tu matas, infeliz,
Aproveita a ocasião,
Trespassa o meu peito,
Fere o meu coração,
Morrendo, tou consolada,
Contigo, não caso, não!"
O Governador entusiasmou-se,
bateu palmas e pediu bis
e no outro dia nomeou a negra
Secretária de Cultura.

Quem ficou triste foi Mateus
- dançarino do Guerreiro
e vendedor de ervas ­
que amava em silêncio a Negra Fulô
(Agora não mais teria
perto dos olhos
a dona do seu coração...)

A ascensão de Fulô,
tão rápida e fulgurante,
provocou na Primeira-Dama
um ciúme muito grande.
E a Primeira-Dama convocou
o Secretário de Segurança
para dar cabo da Negra Fulô.

O secretario mandou
raptar a Negra Fulô,
mas quando a viu de perto,
o homem se entusiasmou com a beleza da negra
que era um esplendor.
Prometeu-lhe então a vida poupar
se a negra aceitasse
com ele casar.

De cima do seu orgulho,
a negra ihe respondeu:
"Tu matas, infeliz,
Aproveita a ocasião,
Trespassa o meu peito,
Fere o meu coração,
Morrendo, tou consolada,
Contigo, não caso, não!"
Furioso, o Secretário deu um tiro
no peito da Negra Fulô.

Quando Mateus soube
do crime que sucedeu,
preparou uma mezinha,
derramou nos lábios da negra
e a negra ressuscitou.
Assim que se levantou,
tendo no peito,
ao invés da ferida,
uma flor,
Fulô foi para outras plagas
pois já estava cansada
de ciúmes de mulher do senhor.
A negra se foi majestosa,
com a coroa da Lira,
enquanto o coro do Guerreiro cantava:
"Meus Santos Reis
Aqui chegamos nós
Chegou nossa Lira
com seus caracóis."

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