11/16/2019

República

Maurício de Macedo

Sem saber o que dizia,
um marechal a proclamou.
Com mãos de ferro
um outro a consolidou.
Quem a concebeu?!
Os filhos dos barões do café
que estudavam no exterior.

Num rincão distante,
entre lagoas e coqueirais,
os instrumentos viraram mito
- terra dos marechais.
É que são espelhos os mortos
onde os vivos querem se ver.
E uma fantasia no passado
costuma adornar o poder.
Ao senso humano porém irrita
a contraditória aleivosia
- posa de mãe da República
uma nova monarquia.

O Cristo jansenista de Santa Maria Madalena da Alagoa do Sul

Maurício de Macedo

Braços levantados,
olhando para o alto
- só para os escolhidos
haveria salvação.
Chegara clandestino
o santo herege
fugindo da inquisição.
(Pouco afeitos à leitura,
os franciscanos não perceberam
a tal dissimulação.)
E ele esperava a chegada
dos calvinistas batavos
àquele perdido rincão.

Os calvinistas chegaram,
mas não vieram pra ficar.
e ele ficou sozinho
com sua esperança perdida
que ninguém soube decifrar.

Só na América tropical
numa igreja com nome de pecador
poderia se abrigar aquele Cristo
soberbo na sua dor.
Porque não existe pecado
abaixo do Equador.

Finados

Maurício de Macedo

Arrancadas do silêncio,
as palavras são flores
que levo amiúde para eles.
(Saem por vezes despetaladas
ou me deixam com as mãos feridas
quando tento arrancá-las.)

Não sei se eles gostam
desse tipo de flores...
Teriam preferido talvez
que desabrochasse o girassol
do meu ouvido de outrora.

Os críticos

Maurício de Macedo

Com suas lanterninhas
vão apontando aqui e acolá
no chiaroscuro da noite.
Acima deles, imenso,
o céu estrelado.
A luz que direcionam
não consegue ofuscar
as estrelas
que não precisam do foco
de suas lanterninhas.