3/21/2018

Novos-ricos da cultura


Maurício de Macedo

Diziam Drummond,
diziam Clarice...
como se fossem seus parceiros,
com os quais privassem
da maior intimidade.

Saltitando como gralhas
com penas de pavão,
a afetação se disfarçava
de naturalidade.

Imagem e semelhança


Maurício de Macedo

Alguém diz
Parece com você.
E na imagem e semelhança
do filho jovem
 de algum modo se refaz
o moço que um dia ele foi.

Privilégio de quem é pai
- a juventude perdida
que no filho se refaz.
Não é à toa que Deus é eterno

Gente humilde


Maurício de Macedo

"É gente humilde
que vontade de chorar"
Garoto/Vinícius de Moraes/Chico Buarque


Todos tinham a pele
cor de chocolate.
Ele dirigia a bicicleta,
a mulher na garupa
e as duas meninas
- laçarotes nos cachinhos dos cabelos,
arrumadinhas no fardamento escolar -
sentadas no banquinho
que ele improvisara
preso ao guidon.

Ele, operário da construção,
provavelmente.
Ela, empregada doméstica.
As meninas,
alunas do grupo escolar
municipal.

Passei ao lado e percebi
que há muitos brasis,
além da política
e da página policial.

Epistemologia do pum


Maurício de Macedo

O intelectual francês pesquisou 
e escreveu 
sobre a história do pum
- o pum na Antiguidade,
o pum na Idade Média,
o pum na Revolução Francesa...
E virou coqueluche o livro
sobre a história do pum
- na periferia sobretudo
onde a moda chega
em primeiro lugar.

E os assanhados acadêmicos
passavam o tempo a cogitar
- o pum no feitio de Marx,
o pum no feitio de Freud,
o pum no feitio dos gurus
que costumam abundar.
(Não era coincidência o verbo.)

E criaram-se linhas de pesquisa
do pum,
pós-graduações do pum...
Doutores e pós-doutores competiam
com paradigmas diversos
sobre a histórica nacional do pum
- o pum de Zumbi,
o pum de D. Pedro II...
na visão marxista,
freudiana,
foucaulteana...

E era pum pra lá e pum pra cá,
pelo menos enquanto durasse
o frenesi.
(Do outro lado do oceano
alguém já escrevia
sobre a história do xixi.)