3/01/2009

O Sonho

Indignada com o sofrimento
entre os negros da senzala,
a Negra Fulô fugiu para um tempo
muito depois da escravidão
e foi ser faxineira na cidade de Maceió.

Era um tempo de república,
de democracia e de eleição.
E percorriam o Brasil
falando em ruas e praças
candidatos do governo e da oposição.

A convite do sindicato
das faxineiras da cidade,
Fulô foi assistir na praia da Pajuçara
ao discurso de um candidato
que tinha como lema:
Ainda que tardia, a liberdade.

Joaquim José, deputado das Minas Gerais,
representava a oposição
e falava com voz mansa
sobre trabalho, progresso e paz.
A negra se encantou
com seu olhar tão suave,
com suas palavras bonitas,
falando que o povo sofria
miséria e exploração,
pedindo que todos se unissem
para garantir a vitória
do candidato da oposição.

Fulô saiu do comício
pensando no deputado
(Como era bonito,
que palavras tão lindas dizia...)
À noite, porém, teve um sonho
de gelar o coração;
Sonhou que o deputado era preso,
que era enforcado na praça
e esquartejado depois.

Como o sonho se repetia
durante noites seguidas,
a negra foi consultar
a mulher que jogava búzios
no bairro da Ponta Grossa.
E os búzios disseram, então,
que mais um sonho bastaria,
para tomar realidade
o que no pesadelo se via.

Fulô foi embora assustada,
percebendo que só um jeito havia
de a tragédia evitar:
Voltou, ligeiro, para o poema
onde os sonhos seriam outros
e Joaquim José não correria o risco
de ser morto e esquartejado,
ainda que a liberdade tivesse que tardar.

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