3/01/2009

A conexão

Para não apanhar do feitor,
acusada pela sinhá,
Negra Fulô levantou-se, à noite,
escapou pela estrofe que unia
o engenho ao tempo
e foi trabalhar em Maceió
no apartamento de seu Paulo Calabar.

Era um apartamento muito grande
o de seu Paulo Calabar,
de onde a negra via,
quando limpava o salão,
a copa dos coqueirais
e a imensidão verde do mar.
Era um homem muito rico
o patrão.
Tinha fazendas de cana,
comércio de automóveis...
Na Barra de São Miguel,
uma mansão.
Era um homem muito rico,
de riqueza sem igual.
Financiara até campanha
de deputado federal.

Por vezes vinham alguns homens
entregar a seu Calabar
uns pacotes bem fechados
que ele guardava no cofre
na suíte em frente ao mar.
E vinham depois outros homens
apanhar os pacotes
que guardara seu Calabar.

Dentre as pessoas que por vezes
apareciam por lá,
Fulô se agradou sobretudo
de um gringo de olhos verdes
que convidara a negra
para um passeio ao luar.

Encontraram-se na praia,
conversaram no calçadão,
caminharam à beira-mar
e terminaram a noite
num flat do hotel Meliá.
E os encontros se prolongaram
num caso de amor
que muito prazer trazia
para a Negra Fulô.

Certa noite, quando namoravam
numa praia deserta,
ouviram um ruído de passos
por trás de uma vala aberta.
A negra percebeu,
apesar da escuridão,
o rosto de um dos capangas
das fazendas do patrão.
E depois foi um tiro,
ecoando na solidão,
e o gringo jazia morto
com o rosto no chão.

Assustada, a negra saltou,
fugindo das balas
que zuniam de raspão
e correu para o mar,
pedindo à rainha das águas
proteção.
Em seu manto de águas,
Iemanjá abrigou Fulô,
resguardando a negra
da fúria do matador.

Na corrente marinha
Fulô foi levada,
nuinha, até o poema
onde chegou toda molhada.
No outro dia, em Maceió,
os jornais noticiavam
em letras garrafais:
Estrangeiro envolvido em tráfico de drogas
é encontrado morto num banco de corais.

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